terça-feira, 30 de setembro de 2008

Quadro

Se soubesse o que fazer
eu já o teria feito.
Se hoje espero, não é por resignação ou conformismo;
é porque acredito.
No meu silêncio não há lamúrias ou abafamentos.

Mastigo tudo lentamente;
na garganta engasgada
o doce sabor do fel mistura-se ao sangue
dessas feridas.
Sinto próximo o momento do escarro.

Olhos fitos na parede nua,
a imaginar a moldura dos crimes que cometerei
pra aliviar toda essa cólera dentro de mim e de outros.
E os pendurar na parede a fim de aviso
aos que virão.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Sobre corpos e ganas

Se a mulher caminhava
a saia dela
se abria e se fechava

Um olho via
o que saia mostrava
enquanto se abria

E desejava
o que a saia escondia
quando se fechava

E rezava
para que se movesse
se a mulher parava

Se ela se movia
a longa saia
se fechava e se abria

E revelava
o que o olho mais queria
a alma mais ansiava

Na fenda aberta
o relâmpago
da perna exposta

Era mancha de sol
limpando a carne
de todo mal

Um olho comia
a mulher anônima
e ela nem sabia

Dois Santos dos Santos

terça-feira, 10 de junho de 2008

Griffe

Comprei um jeans staroup
Só pra ver se meu bem
me queria
(não quis)

Tentarei com Calvin Clain
Lee Levi´s Zoomp

(se nada disso resolver
Ficarei pelado)


Luiz Vitor Martinello

terça-feira, 3 de junho de 2008

Caderno de poesia

Caderno poético:
retrato meu
riscado à mão.
Cada verbete em si
me revela, seduz;
e eu sou eu
desnuda para ti
um bom leitor.
Por favor,
ao ver assim meu coração
despido,
não me faças mal.
De todos os erros,
não há hoje só um
que eu não queira ter cometido.

Julieta Rodrigues

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as dores que ele teve,
Mas só as que ele não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração

Fernando Pessoa

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Infância

No meio do caminho desta infância
achei-me em terras nebulosas.
Por entre delírios sinestésicos
guiou-me sabiamente minha mãe.

Tal como um titã,
juntei continentes silábicos
e formei minhas pangéias.

A partir daquele momento,
meus olhos cegos podiam ouvir
as imagens que eu copiava.


Giovanni

terça-feira, 29 de abril de 2008

Detalhe

ah, realidade!...
a realidade...
é só um passatempo.
E quanto aos sonhos , isso sim eu levo a sério.
Nossa imaginação é o único lugar
onde somos de fato livres
(aprendi com um professor de química ,já que química eu nunca aprendi)
e é uma liberdade que não vem de graça :
o medo do ridículo, o medo do inconcreto , o medo do fracasso sempre nos oprime.
Mas quando a gente sonha , é como se derrubássemos todas as Bastilhas,
e porões que nos confinam:
o sonho o alarme do levante.
é o grito de guerra , o canto de liberdade.
Quanto mais nos utilizamos do recurso abstrato do sonho, mais reais nos tornamos.
Só pra passar o tempo...
Thiago Teixeira